
Pessoas cegas ou com baixa visão agora podem vivenciar a arte urbana por meio do tato e da escuta. A EMEF Prof. Alfeu Luiz Gasparini, localizada no bairro Ipiranga, em Ribeirão Preto, ganhou um mural tátil acessível em seu muro externo, com três pinturas em relevo, placas em braile e QR codes com audiodescrição. A ação já está disponível ao público e pode ser apreciada por todos os pedestres que passam pela calçada da Avenida Dom Pedro.
Cada obra recebeu uma plaquinha com título em braile e nome da artista. Já o QR code direciona os deficientes visuais a um vídeo no YouTube, no qual podem ouvir as histórias contadas no mural, gravadas pelas próprias autoras.
A intervenção artística faz parte do projeto "Traços Femininos – Grafite como Expressão de Inclusão e Resistência", idealizado pelas artistas Cathe, Joy e Zanna. O mural foi concebido como uma galeria a céu aberto, com a missão de valorizar a presença feminina na arte urbana e ampliar o acesso de todos para além dos espaços tradicionais, de forma verdadeiramente inclusiva.
As três obras utilizam relevos, texturas e materiais sensoriais, como ladrilhos, massa corrida e serragem, para criar experiências táteis. A elaboração contou com a participação da Adevirp — Associação dos Deficientes Visuais de Ribeirão Preto — do Lar dos Cegos e da artista visual cega Kelly Martins, que contribuiu com orientações fundamentais para a criação.
Durante a execução do mural, os alunos também participaram de uma vivência sensorial, experimentando a arte de olhos vendados. A ação promoveu conversas sobre acessibilidade, espaço público e a presença feminina. Mais do que um trabalho visual, o projeto convida a cidade a refletir sobre inclusão, empatia e pertencimento nos locais urbanos. Essa experiência com os estudantes poderá ser repetida durante a presença da imprensa, como forma de demonstrar a proposta do projeto na prática.
Com cerca de 1.300 alunos, de 6 a 17 anos do Ensino Fundamental e também da Educação de Jovens e Adultos (EJA), a EMEF Alfeu Luiz Gasparini tem um histórico de inclusão. “Apesar de hoje não termos alunos cegos matriculados, nossa escola já foi referência em inclusão com sala de recursos para deficientes visuais. Essa pintura traduz um pouco do que somos. Os alunos vivenciaram a experiência com os olhos fechados, explorando o mural com as mãos, desenvolvendo empatia e novas percepções do mundo”, destaca a gestora da escola, Cibele Zanatta da Silva Pereira.
Obras que compõem o mural
1. “Zeni”: a artista Zanna trabalhou a personagem no estilo mais cartoon, com a ideia de transmitir doçura e suavidade nos traços da personagem, que também está olhando para o céu, transmitindo a ideia de esperança e calma. O cabelo se mistura com as nuvens para reforçar essa sensação de leveza.
2. Joy tem como estética própria retratar mulheres, focando em seus rostos, normalmente com expressões sérias, em cores não convencionais como azul e verde para a pele e com cabelos coloridos. Sua proposta é trazer o protagonismo feminino, focado na força da mulher e sua ligação com a natureza.
3. “Gato Xadrez”: com uma estética mais lúdica, Catherine levou para os muros da escola um personagem das histórias criadas por seu pai durante a infância, que, em teoria, eram para fazer com que ela e sua irmã dormissem, mas acabavam provocando agitação e muitas gargalhadas. Uma boa lembrança daquele tempo! Foram trabalhados os contornos em alto relevo, mosaico de ladrilhos nas flores e serragem nos pelinhos do peito do gato, trazendo diferentes texturas para a obra.
“A arte urbana tem como objetivo levar acessibilidade à própria arte. Mostrar que ela é para todos, e não só para quem pode ir a um museu. Com essa premissa, surgiu a vontade de criar um mural na rua que fosse, de fato, acessível a mais pessoas. Por isso, pensamos em desenvolver uma obra em relevo, que também pudesse ser apreciada por pessoas com deficiência visual”, ressalta a artista visual Catherine Palis.